sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Teatro Gil Vicente


O dia amanheceu frio e com chuva, cheirando a Outono. Valpaços cidade transmontana onde nasci e habito, integrada na região da Terra Quente parece não fazer jus ao nome que ostenta. Os persistentes arrufos do vento vão fustigando as árvores, soltando as folhas coloridas numa espécie de bailado melancólico, espalhando-as pelo chão. Para amarfanhar a espertina da manhã cinzenta, nada melhor do que exercitar o pensamento e aproveitar a boleia do tempo até às terras quentes de Moçambique. Dou comigo a pensar como era agradável ir à matinée em dias de chuva e fixo o olhar no belo Teatro Gil Vicente. Quem lá esteve, se bem se lembra situava-se na Av. D. Luíz I (hoje Samora Machel) mesmo defronte do Jardim Botânico Vasco da Gama (hoje Jardim Tunduru) e paredes meias com o Prédio Lusitânia. Totalmente recuperado dos escombros, após um incêndio que o destruiu na década 30, o edifício encerrava dentro de si a magia e a arte dos espetáculos. Pelo seu palco, passaram orquestras sinfónicas, companhias de teatro, artistas conceituados, revista à portuguesa e grandes películas cinematográficas. Recordo com saudade os filmes que por lá se estrearam classificados para maiores de 12 anos, criavam a ideia do estatuto de pequenos adultos e eram o regalo dos nossos sentidos, desafiando a irreverência e fantasia do público mais jovem. Finda a(s) matinée(s) os que não tinham os seus progenitores à espera no carrinho, aproveitavam para uma pequena volta até ao parque botânico e no virar da esquina os últimos trocos na algibeira ainda chegavam para ir ao Salão da Cooperativa dos Criadores de Gado, beber um chocoleite delicioso  e para uma nata recheada. O regresso a casa do pequeno grupo do meu bairro, fazia-se antes do anoitecer (pudera) apanhando o machimbombo na paragem junto à Casa da Sorte no cruzamento da Av. da República (hoje 25 de Setembro) com a Av. Manuel de Arriaga (hoje Karl Marx). A linha 13 e 15 dos S.M.V com destino ao Aeroporto de Mavalane, levávamo-nos ao Bairro da Munhuana. Depois era a hora do recolher obrigatório. Assim se sentiam felizes os adolescentes do meu tempo, que deram rosto a uma geração que já vai longa mas capaz de olhar para o passado com orgulho da época que viveu.

Manuel Terra